22.1.12

Os melhores anos




No inicio de Janeiro o António regressou da Bélgica. O António foi para lá viver com os pais mal acabou o 9º ano e nunca mais ninguém o viu. Foi talvez o meu grande amigo de infãncia apesar de uma vez o ter feito chorar, o problema é que eu era péssimo na disciplina de trabalhos manuais por isso roubei-lhe o trabalho e meti o meu nome, nunca fui apanhado. Nesse tempo eu tinha a manía de comer a borracha e ele o carvão dos lápis, a certa altura a professora descobriu e meteu-me ao lado do Fábio que era o mais burro da turma e deu-me autorização para lhe dar estalos sempre que ele falasse. Mas havia mais burros na turma, o Bruno que depois se mudou para outra turma, uma vez disse que a capital de Portugal era Fátima. 

No 5º ano entrou para a turma um rapazinho Africano chamado Alex, nos ensaios para uma peça de teatro da disciplina de Educação Moral nenhuma rapariga quis dar a mão ao Alex apesar dessas raparigas terem escolhido para tema da peça precisamente o racismo, por isso a professora meteu o Alex a dar a mão a mim.

No 9º ano fomos para a Assembleia da República assistir a uma sessão do Parlamento. Comprei um jornal Record e no autocarro  liguei para as mulheres nuas de valor acrescentado que mais tarde vim a saber que afinal eram máquinas. Liguei com o António que no primeiro ano me roubou a namorada, o sacana aproveitou-se do meu telemóvel para ouvir uma mulher a perguntar qual era a sua cor preferida. Respondemos VERDE! porque somos do Sporting, e quando com uma voz sensual perguntou a nossa posição favorita eu disse avançado e ele defesa.

Uma vez no dia da criança fomos plantar uma árvore no bosque junto ao lago que fica atrás da escola primária. A partir daí, todos os dias fizesse chuva ou sol eu e o António passávamos pelo lago antes de ir para casa para ver o tamanho da árvore, queríamos vê-la crescer e imaginávamos que ela um dia chegaria ao céu, prometemos proteger aquele lago e aquela árvore com unhas e dentes e até construímos espadas de pau caso fosse preciso combater. Passámos muitas tardes no lago, o nosso passatempo favorito era ir para a margem atirar pedras aos sapos. De calções e pensinhos nos joelhos escolhíamos as pedras mais achatadas e atirávamos com toda a força que tínhamos e as pedras voavam sobre a água como aviões na pista a levantar voo. 

Este domingo, ao fim de tantos anos, reencontrei finalmente o António e numa conversa na esplanada entre muitas histórias e recordações felizes ele aponta para a testa e pergunta-me: 
-lembraste desta cicatriz? 
-lembro, lembro. respondo-lhe, -foi um avião dos meus que saiu de pista ao levantar voo!.
E soltamos os dois uma enorme gargalhada.
Estava uma tarde de Janeiro com um sol maravilhoso e o António desafia-me a ir a pé até lago que durante tanto tempo tão bem protegemos com espadas de pau. Eu aceitei de imediato! Pelo caminho recordávamos a árvore que plantámos nos dia da criança e o lago cheio de sapos verdes e viscosos, questionávamos o tamanho que teria hoje a árvore, imaginávamos um domingo cheio de sol com crianças de calções e pensinhos nos joelhos a atirar pedras aos sapos, velhotes a pescar no lago e familias inteiras a fazer pique-niques a sombra da "nossa" árvore.
Quanto mais nos aproximávamos mais ansiosos ficávamos.

Mas passaram-se muitos anos...
E onde esperávamos encontrar um lindo bosque está hoje um luxuoso condomínio fechado, onde em tempos foi um lago cheio de peixes é hoje uma enorme piscina e no lugar da nossa árvore esta uma pequena palmeira a crescer... 



17.9.11

O aniversário do Pedro

Sentado no banco do jardim olho através das árvores para o prédio em frente. Concentro-me na janela do 2º andar, lá está ela. São dez horas da noite e vai fumar um cigarro. Já reparei nela há algum tempo, todos os dias à mesma hora. Nesses momentos solto a cadela e fico a observá-la. Hoje a cadela foge atrás de um gato preto e interrompe-me o momento. Quando regresso ao banco do jardim ela já voltou para dentro de casa. Resmungo em surdina. O gato estragou-me o melhor momento do dia. Não sei nada sobre ela, a não ser que é nova no meu bairro.

Um destes dias cruzo-me com ela na bomba de gasolina, olha para mim com um sorriso, surpreendido não sou capaz de lhe dizer nada, eu entro ela sai, estava acompanhada por uma amiga, falavam das férias lembro-me.

Descobri que trabalha numa loja de roupa no Chiado e no dia seguinte vou ao trabalho dela, mas, ao ver-me perante uma colega dou-me conta que não posso pedir para falar com ela porque não sei o seu nome e, mesmo que soubesse, não saberia o que lhe dizer. Provavelmente ficaria de novo calado e ela pensaria que eu era um tipo desequilibrado, um doido. Por isso inventei uma desculpa e vim-me embora.


Na sexta-feira sou convidado para uma festa, é o aniversário do Pedro e ele fez questão de convidar alguns dos seus amigos, a festa é ao ar livre, num jardim grande e relvado, estão cerca de 50 pessoas, ouve-se música alta, há gente a dançar, grupos de amigos a conversar, um pequeno bar. Eu deambulo por ali sozinho á procura de alguém conhecido. Subitamente, mesmo à minha frente, lá está ela, também sozinha. Tem um copo na mão e um ar um pouco perdido naquele ambiente. "Eu conheço-te", diz ela, "passeias todas as noites com a tua cadelinha no jardim". Faço que sim com a cabeça, um pouco atrapalhado. "Costumo ver-te sentado no banco do jardim quando vou à janela fumar um cigarro". Eu sei, digo, também costumo ver-te, mas não sabia que tinhas reparado em mim. Ela ri-se, "reparei, és o único que pára e fica a olhar para mim sentado naquele banco". Entretanto somos interrompidos, o Pedro aproxima-se, beija-a apaixonadamente e diz-me sorrindo: "Esta é a Mariana, a minha namorada, não sabia que já se conheciam". Fecho os olhos e faço-lhes uma careta enquanto se beijam de novo. Pouco depois saio da festa. Vou a casa, pego na trela e depressa volto à minha rotina.

11.11.09

O casaco azul

Passei parte da minha infãncia a observar um casaco azul pendurado num cabide no quarto dos meus pais. Tentava perceber porque seria tão especial aquele casaco.
Era um casaco azul com botões prateados e com um corte clássico dos anos 60 ou 70.
Mesmo depois da minha mãe morrer continuei sem saber a importãncia daquele casaco sempre tão escovadinho, tão perfeitinho.

Numa manhã, ao passar pelo quarto do meu pai vejo-o a chorar sentado na cama de casal que em tempos partilhou com a minha mãe. Sentei-me ao seu lado, peguei-lhe nas suas mãos grandes e àsperas e perguntei-lhe porque chorava.
-Vesti este casaco quando casei com a tua mãe -respondeu.
-Foi o dia mais feliz da minha vida, e desde que Ela partiu eu nunca mais consegui ser feliz.
Permaneci em silencio.
-Prometes-me uma coisa filho? -perguntou-me.
-Claro pai! -respondi, beijando-lhe a face picante da barba por fazer.
-Um dia quando eu partir para junto da tua mãe quero ir com este casaco vestido. Foi ao lado da tua mãe que o vesti pela única vez, e é quando a reencontrar que o quero ter vestido de novo.
Agora era eu quem chorava.
Percebera finalmente o valor do casaco azul.

Aquele casaco fez parte da minha infãncia. Muitas vezes vestio-o sem o meu pai saber, para fingir ser um homem grande no meu mundo pequenino. Cresci a olhar para ele, a observá-lo, a apreciá-lo, a tentar perceber a sua história...

Hoje custou-me entrar naquele quarto e ver o cabide despido... E saber que nunca mais verei aquele casaco azul.










30.7.09

Final de tarde

No ultimo domingo estava sozinho em minha casa, sentado no meu sofá a tentar descansar, quando o telefone tocou. Sei que eram 20h00 pois o televisor estava ligado e lembro-me que estava a começar o telejornal.
Levantei o auscultador e do outro lado um homem de voz rouca perguntou se estava a falar com o Pedro. Disse-lhe que não, que tinha ligado o numero errado e desliguei.
Depois voltei a encostar-me no sofá e depressa me esqueci do telefonema.
No dia seguinte o telefone tocou outra vez. Era o mesmo homem, fazendo a mesma pergunta que me tinha feito no dia anterior. Voltei a dizer que não e voltei a desligar. Mas desta vez comecei a pensar no que teria acontecido se tivesse dito que sim. E se me tivesse feito passar pelo tal Pedro? Se o homem voltasse a telefonar pelo menos falaria um pouco com ele, e tentaria saber o que se passava. Depois disto as ideias começaram a fervilhar dentro da minha cabeça, e pouco a pouco abriu-se um mundo inteiro de possibilidades. Seria o homem de voz rouca um marido traído procurando vingança? Estaria esse Pedro a dever muito dinheiro a alguém? Podia até ser um agente a anunciar este tinha ganho um prémio chorudo, ou uma viagem! (já me estava a imaginar com os bilhetes na mão)...
Na terça-feira à mesma hora o telefone voltou a tocar, desta vez eu estava no banho e já não fui a tempo de atender a chamada.
Então na quarta-feira fiz um enorme esforço para estar em casa aquela hora, sentia-me estranhamente excitado com toda esta situação imaginaria criada pela minha mente. Esperei que o telefone tocasse outra vez mas a quarta chamada nunca chegou a existir.
Fiquei sem saber quem me ligava todos os dias às 20h00 em ponto, e pior ainda, fiquei sem saber quem era o Pedro e se este existia mesmo.
Hoje fui jantar a casa do meu pai. Como tenho a chave entrei sem bater à porta, o Sr Armando nem deu por mim, estava misteriosamente concentrado com o auscultador do telefone ao ouvido... Eram vinte horas em ponto.

8.4.09

A moradia 17



Estão dois homens a pintar a moradia que fica em frente à casa do meu pai, o que significa que os Müller devem vir passar a Páscoa a Portugal. Os Müller são uma família Alemã que tem uma casa de férias no meu bairro, mas já cá não vêm há tantos anos, que até pensei que tivessem morrido. Eu tinha seis ou sete anos e adorava quando eles vinham cá passar o Verão. Todos os dias me levavam à praia porque precisavam de alguém para brincar com a filha, porque eu tinha a mesma idade dela e porque eu era o único menino que eles conheciam na minha rua. A Kristin e eu mal nos percebíamos, mas nada que nos impedisse de aventurar pela praia sozinhos enquanto o Sr Jürgen dormitava na esplanada do Cascais Bar.

Um dia enquanto brincávamos na água, uma onda mais forte arrastou a Kristin, e lá estava ela prestes a morrer afogada. Sem perder tempo mergulhei, agarrei-lhe a mão direita e, com um gesto rápido puxei-a para um lugar seguro.

Durante os anos que se seguiram senti que este fora o melhor momento da minha vida. Tinha na realidade salvo a vida de alguém, e tinha ficado fascinado com a rapidez e a segurança dos meus movimentos nesse instante crítico. Via o salvamento na minha cabeça vezes sem conta, e vezes sem conta revivia a sensação de puxar aquela menina de dentro do mar.

Desde esse ano os Müller só vieram mais dois Verões, e eu não voltei a vê-la durante mais de quinze anos.

Esta manhã quando passei e vi a moradia 17 ser pintada não imaginava a surpresa que me esperava. Quando de noite fui visitar o meu pai, por acaso ou não, a minha velha amiga apareceu para me cumprimentar. Está agora crescida, é uma jovem mulher de vinte e cinco anos, que acaba de se licenciar, e devo dizer que senti algum orgulho em me ter procurado. No meio da difícil conversa que tentámos estabelecer, aludi à tarde de verão em que a tinha puxado debaixo da agua. Tinha curiosidade em saber até que ponto ela se lembrava de ter estado à beira da morte, mas pela expressão da sua cara quando lhe fiz a pergunta, era óbvio que não se lembrava de nada. Um olhar vazio, um ligeiro franzir de sobrancelhas e por fim um encolher de ombros.
Compreendi então que ela não se tinha apercebido que tinha estado em perigo. Todo o incidente ocorreu num instante, dez segundos, dez segundos da sua vida, um intervalo de tempo sem importância para ela. Para mim, por outro lado, esses dez segundos tinham representado uma experiência inesquecível, um acontecimento único na historia da minha vida.




25.3.09

from kosovo with love


São nove horas de uma manhã igual a tantas outras, e a minha corrida termina dentro da água, ainda gelada, da praia de Carcavelos. Agora corro sempre sozinho e mergulho sozinho...
Desde que o Manel partiu, as corridas já não têm piada, nem as corridas nem os mergulhos na água gelada.

"-O ultimo a entrar é um ovo podre!" Gritava ele enquanto fugia pela areia fora, ao mesmo tempo que se despia. E estas palavras motivavam-me a correr rapidamente, mergulhando sem hesitar nas gélidas águas de Inverno... Nenhum dos dois queria ser o "ovo podre", era demasiado irritante ter de passar o resto do dia a ouvir o outro tratar-nos por esse nome. Ganhava sempre eu! O Manel sempre foi o mais corajoso, mas eu o mais rápido...

Desde que decidiste partir para uma guerra que não era tua, para um país que nem sabias ao certo onde ficava, e defender pessoas que nem sequer conhecias, que as corridas na praia deixaram de fazer sentido.

Certa noite acordaste-me e disseste-me ao ouvido, para que o pai não ouvisse, que não conseguias ficar parado sabendo que milhares de pessoas morriam vitimas de uma guerra que não pediram. Sempre que falavas nisso, eu encolhia os ombros e dizia que nada podíamos fazer pela paz no Mundo, tu provaste-me o contrário! E hoje arriscas a tua própria vida para proteger Homens, Mulheres e Crianças que nem sabes sequer pronunciar o nome correctamente.

São nove horas de uma noite igual a tantas outras...
-O ultimo a entrar é um ovo podre!
-Estás doido!? acabas-te de regressar, estão todos à tua espera!
respondi. Mas camisola e calças já voavam pelo ar, e a escuridão da noite não permitia ver senão um rasto de pegadas na areia que só terminou no mar.

... Bem-vindo!

20.3.09

Más companhias.


"-Queres uma pastilha?" Foram as minhas ultimas palavras antes de enfiar a roda na valeta.

Pensando em como algumas amizades se mantêm e outras não, lembro-me do facto de já ter furado três pneus desde que conduzo, e de nessas três ocasiões o Hélder estar dentro do meu carro...

Eu e o Hélder somos amigos desde a escola primaria, e embora sempre tenha havido um ou outro conflito na nossa amizade, ela tem resistido até aos dias de hoje... Ou pelo menos até ao dia de ontem!..

Ontem à noite, regressávamos os dois do Vasco da gama quando, uma manobra perigosa do carro que seguia à minha frente obriga-me a enfiar a roda dentro da valeta, resultando no terceiro furo da minha vida!
Fechei os olhos, desliguei o motor e inspirei bem fundo antes de sair do meu carro, e só então caminhei calmamente em direcção ao outro... E avisto uma bela rapariga de vestidinho curto e saltos altos a tentar sair desse carro com a mesma dificuldade que tem quem já bebeu mais do que a conta.

Claro que um simples telefonema para a policia resolveria o meu problema, mas não! O menino Hélder, motivado por segundas intenções, como é seu habito, decide resolver as coisas de outra maneira e convence-me a não ligar às autoridades. Primeiro pede calma à rapariga, que o olha com ar desconfiado, depois diz-lhe que tudo se vai resolver amigavelmente e que no dia seguinte a irá contactar para tratar de toda a papelada do seguro, mas que para isso acontecer precisaria ter o seu numero de telemóvel. Ela concordou acenando com a cabeça e, sorrindo com nervosismo lá escreveu alguns números meio tortos num lenço de papel sujo de maquilhagem. E alegremente seguiu viagem.

O Hélder esfregava as mãos de contente, pois já tinha o numero da rapariga e o segundo encontro com ela estava mais do que certo.
Olhou para mim, mordendo o lábio como quem diz: "-viste como se engata uma gaija?" enquanto eu abria e fechava a boca, como um peixinho fora de agua, ao mesmo tempo que mudava o pneu furado.

Hoje à tarde, como ele não dizia nada, e eu queria era o dinheirinho para comprar o pneu novo, decidi ir ter a casa dele, para saber o ponto da situação...
-Então, ligaste-lhe? -perguntei eu entusiasmado.
-Vá lá! fala homem, o que disse a rapariga?
-Oh... Calma! Liguei.... Liguei e só ouvi uma rapariga com uma voz suave dizer..."TMN, o numero que marcou não se encontra atribuído"
-Grrrrrrrr!!!

Bom, seria estúpido acreditar na existência de uma ligação directa entre conduzir com o Hélder dentro do meu carro e ter um furo.

O simples facto de continuar a ser seu amigo já me parece estúpido o suficiente!

9.3.09

On the road to Barcelona




Tomava um duche rápido quando a campainha tocou. Estava cheio de pressa! E a escorrer em água fui abrir a porta. "-Lena!? Olha maninha estou super atrasado para a minha aula, e tu não deves ter vindo cá para me dar nada portanto, pira-te!" E é quando vejo os diabinhos aos pulos a correr em minha direcção "-Desde quando voltaste a estudar? Vá Zé tenho de ir ao Norte, fica lá com eles e cala-te!" Deixando-me confuso e sem hipótese de dizer NÃO!

A minha mana deixou-me a agradável tarefa de tomar conta do Leandro e do Tomás e logo hoje que tinha a minha segunda aula de guitarra.
Eles adoram ficar com o tio, mas são muito exigentes. Como ainda era cedo para o almoço disse-lhes que íamos jogar playstation, eles fizeram uma cara de enjoo e pediram antes alguns livros para ler. Enquanto liam, aproveitei e fui organizando o caos em que a casa se tornou nos últimos dias. Algumas horas depois e já cheio de fome anunciei orgulhosamente que iríamos almoçar ao McDonalds esperando ver algum brilho nos seus olhos, em vez disso eles dizem: "-Não nos fazes antes tu o comer tiozinho?" Mesmo a calhar, a Susana ensinou-me ontem a fazer empadão hi hi! Mas...será que já não se fazem sobrinhos como antigamente?

Não fumo, nem nunca fumei!...
Ou melhor, comecei a fumar no inicio do ano, pelo menos a fingir. Como tal, todos os dias ponho três euros e cinquenta cêntimos num porquinho mealheiro cor de rosa.
Eu, o João, o Marco e o Pedro temos um objectivo... Ir a Barcelona em Agosto! Pelas nossas contas nessa altura cada um terá no seu porquinho cerca de oitocentos euros...
A minha avó divorciou-se há cinquenta anos, era a minha mãe pequenina, e nunca mais tivemos contacto com a família da parte do meu avô Espanhol. Apenas os conhecemos das histórias que a minha mamã orgulhosamente nos contava.
Em Agosto vamos alugar uma caravana e partir à aventura, mas não é só o sol quente, e as belas praias que nos levam a Barcelona, a partir de uma morada de uma antiga carta enviada pelo meu avô em 1995, os quatro vamos tentar encontrar a família perdida...e descobrir uma outra parte de nós.








2.3.09

A gaiola amarela

Um homem com cara de Woody Allen olha com um ar triste para mim, recordando-se talvez do tempo em que também era jovem e nenhum problema o incomodava, uma bela enfermeira passa e sorri para ele, e acho que isso lhe levantou o Ego pois com um só gesto ajeitou a gola do casaco, endireitou a postura, retribuiu o sorriso e pôs os olhos num velho jornal, libertando-me do seu incomodativo olhar.

Esta sala é diferente!
Diferente de todas as outras salas de espera em que eu já estive, aqui as flores são verdadeiras e não há relógio na parede nem televisão a berrar, em vez disso uma suave melodia percorre todo o espaço. Três pássaros numa gaiola amarela ao canto da sala são os responsáveis, tanto pela melodia como pela calma que estranhamente se sente no ar. Aquela gaiola amarela torna esta sala ainda mais única, e enquanto todos fixam atentamente os olhos nela, uma menina alimenta os pássaros com bocadinhos de bolacha perante o olhar sorridente da sua mãe, a menina com um vestidinho da Hello Kitty e olhos gigantes não tem cabelo...não tem ela, nem o Sr com cara de Woody Allen, nem nenhuma das outras pessoas que pacientemente aguardam a sua vez.

Olhei para o lado, o meu pai parecia também hipnotizado a olhar para a gaiola, como se a vida daqueles três pássaros azuis fosse mais interessante que qualquer outra coisa.
Estou na sala a aguardar a primeira consulta de oncologia do meu pai, e só eu parecia não querer saber, nem dos pássaros nem da gaiola, tentava antes imaginar como será o meu pai sem o seu lindo cabelo encaracolado...

23.2.09

Vidas cruzadas

Ontem fui ver o Slumdog Millionaire. Adorei! O filme está genial, fiquei fascinado com a historia de Salim Malike e com a beleza de Latika (uma Indiana chamada Freida Pinto, pelo nome talvez seja descendente de colonizadores portugueses na Índia).

E ontem fez precisamente dois anos que tomei a decisão de cortar o cordão umbilical e sair de casa dos meus pais. Apesar da idade e da irresponsabilidade natural de um jovem, senti que chegava a altura de começar a minha própria vida, ou melhor...uma vida a dois!
Passados dois anos não estou arrependido, mas admito que partilhar o meu espaço com alguém não é nada fácil, principalmente quando a outra parte passa os dias deitada no sofá a olhar para a televisão ou simplesmente a dormir. Mas o amor vence tudo, e a verdade é que eu sou recompensado com carinho, miminhos e muitos beijinhos.
Bem, a nossa vida não é propriamente a de um casal apaixonado mas eu trato-a como uma verdadeira princesa, preparo o comer, faço a cama, e se for preciso ainda lhe apanho os cabelos do chão.
Eu amo a Vaidosa.
Adoro esta sensação de viver com alguém que não está constantemente a falar de saldos, unhas partidas e cabelos espigados, limitando-se a soltar um "auf auf" quando pretende que eu mude de canal.









14.2.09

Silvina

Esta manhã enquanto fazia o trajecto de Lisboa para Sintra pus-me a brincar com os botões do velhinho rádio do meu carro, e ao passear de estação em estação páro numa música que normalmente só ouvia no gira-discos da casa dos meus pais...Essa música, e o agradável solinho que batia no vidro da frente, fizeram-me viajar pelo tempo, e por momentos imaginei-me em criança, enroscado no sofá com o sol a entrar pela janela e a minha mãe a olhar carinhosamente para mim ouvindo a tal música, enquanto eu devorava uma tigela de Cerelac...

"-CAMELO! Anda lá com essa merd*"...grita um condutor apressado, acordando-me dos meus pensamentos.

Dizem que sou igualzinho à minha mãe.
De todos os filhos, dizem que sou o que mais se parece com Ela, principalmente no sorriso, eu não acho isso, talvez tenha herdado a simpatia a timidez mas nada mais...

Já de tarde, no Pingo Doce da Avª Ferreira Borges, estava eu tranquilamente na fila com um pacote de bolachas digestivas na mão, quando ao chegar a minha vez de pagar, a Srª da caixa, uma mulher na casa dos sessenta anos com o cabelo pintado de castanho e umas grandes argolas nas orelhas, pega lentamente no pacote das bolachas e pára a olhar fixamente para mim, olha-me e diz que me conhece de algum lado, "-ups! Será que me reconheceu de quando eu era puto e abria todos os pacotes de cereais à procura dos prémios?" pensei logo, mas ela continuava calada a olhar-me nos olhos...até que subitamente grita: "-SILVINA! o nome Silvina diz-lhe alguma coisa?" e eu respondo: "-sim! é o nome da minha mãe", "-sério? ela andou comigo na escola primária, tinha um sorriso igualzinho ao seu...como é que ela está?". Abro a carteira, mostro-lhe uma foto a preto-e-branco e digo: "-Esta é a minha mãe...partiu há treze anos"

Partiu, mas deixou cá o seu sorriso...

8.2.09

my smile is back


Sentia o estômago cheio de borboletas quando estacionei o carro em frente ao Hospital. Ao longe vejo o meu pai a olhar em volta, de pé e sozinho, à chuva à espera que o viessem buscar...assoei o nariz e limpei as lágrimas. Quando me aproximei dei-lhe um beijo na face e estendi-lhe a mão mas ele recusou a ajuda, estava farto que o tratassem como um velho inválido, ri-me para dentro e lá o segui durante meia hora a vê-lo arrastar o corpo em dificuldades até me dizer "-então! não me dás uma ajuda?". O meu pai estava de volta, teimoso e resmungão como sempre...

Tinha dois bilhetes reservados para ver a minha Diva na sexta feira, mas com esta confusão toda já nem me lembrava. Só que enquanto conduzia em direcção a casa recebo um telefonema do Fórum a pedir confirmação da reserva, seguido de outro da EDP a informar que me cortavam a luz caso não fizesse o pagamento ate às 18h.

São 22h00 de sexta feira, um homem de bigode informa que os bilhetes estão esgotados perante o olhar desesperado de algumas raparigas que se acotovelam à entrada, mas eu não queria saber, eu já tinha o meu, e olhava sorridente para ele. Para mim era um bilhete especial e queria guardá-lo intacto para sempre.
Enquanto esperava pelo inicio do concerto entreti-me a fazer um pássaro em "origami" com o único papel que tinha para pedir o autógrafo à Rita. No final quando me aproximei de Miss RedShoes ela diz "-ai que lindo white bird, é para mim? que simpático!" e eu "sim sim Rita, claro! cof cof", e ups fiquei sem papel e lá teve que me assinar...no bilhete!



2.2.09

Quase famosos

Ontem cruzei-me com um grupo de actores que passeava pelo Chiado, sinceramente não reconheci nenhum, mas a Inês fez questão de me obrigar a tirar-lhe uma foto com um deles, disse-me que ele era de uma novela qualquer e ficou toda contente. Contei-lhe que curiosamente no mesmo sitio me tinha cruzado há tempos com Jonathan Togo da serie CSI Miami, mas acho que ela nem me ouviu, estava entretida a olhar para a fotografia que momentos antes lhe tirara. Franzi o nariz e lá desci em direcção aos Armazéns...

Já na Fnac encontrámos o mais famoso dos nossos amigos, o Hélder, ele já ganhou dinheiro a bater palmas num programa da TVI o que na sua mente o transformou numa espécie de estrela da televisão, e enquanto folheávamos alguns livros, os três recordámos uma situação engraçada que se passou connosco no verão passado.

Numa noite de Agosto estávamos nós (vai-se lá saber porquê) numa casa de fados no Bairro Alto quando, ao entrar um animado grupo de pessoas se gera um burburinho entre a assistência, a fadista que na altura actuava, ao aperceber-se da confusão tenta manter a ordem mas em vão, vai daí acendem as luzes...então eu olho para o Hélder...o Hélder olha para mim e confirmamos que no animado grupo estava a Bjork! a Bjork estava mesmo ali ao nosso lado, mas alheia a este facto estava a fadista que tinha como principal objectivo captar as atenções do publico, e sem imaginar sequer quem seria aquela rapariga de olhos achinesados que estava a distrair os seus ouvintes, solta irritada um valente "shh shh"...


Dias depois Bjork actua perante 20 mil pessoas no Festival Sudoeste.

25.1.09

The Hardest Part

Bati à porta, mas desta vez ninguém atendeu.

É sexta feira, e como faço todos os dias, no intervalo para almoço corri até casa do meu pai para lhe dar um beijinho, muitas vezes prescindo desta refeição apenas para poder ver o seu sorriso. Desta vez não consegui.
-Malandro! deve andar a passear, pensei logo, mas as chaves não estavam debaixo do vaso como de costume o que significa que saiu à pressa, e lá voltei ao trabalho de estômago vazio, mas mais do que isso com a falta de sentir na cara as cócegas provocadas pela sua barba branca e farfalhuda.

Ao anoitecer o meu telemóvel toca, é o meu mano mais velho, atendi...e às primeiras palavras dele só recordo de me sentir agoniado, correr em direcção à casa de banho e cair de joelhos diante da sanita.

Apesar da dor sentida nos últimos dias, houve pessoas que não me deixaram sozinho, e seja a meu lado ou através de um simples telefonema mostraram toda a sua amizade, porque em momentos de tristeza até uma simples mensagem pode transformar-se num sorriso...

Obrigada principalmente à Susana, Cláudia e Cláudia(ViV), Cátia, Joaninha, Sónia, Ana, Gonçalo, Carlos e Gil, e a mais alguém que me possa ter feito companhia apenas em pensamento, uns são amigos de longa data, outros apenas pessoas que até há bem pouco tempo nem sequer sabia da sua existência. Poderiam ter sido muitos mais, se eu não tivesse o hábito de me fechar no meu casulo sempre que tenho um problema.

Hoje comeu bolachas com geleia de framboesa, as suas preferidas, pegou-me na mão e sorriu...

...o seu desejo é vencer esta dura batalha.

17.1.09

Alegrias de um part-time...



Não estava a dar nenhum jogo da Selecção Portuguesa, mas todo o café parou a olhar para o ecrã do televisor.

Enquanto ao canto dois homens discutiam por qualquer motivo, eu mantive o habitual silencio e limitei-me dar o troco a uma Srª mal humorada, que segundos antes reclamava por lhe ter servido um café frio. Maldito part-time! podia reagir mas não me apetecia minimamente discutir com uma Senhora de 100kg...e ela virou-me costas a resmungar.

As noticias na TV pareciam não ser as mais animadoras, mas eu continuava entretido entre cervejas, sandes-mistas e algumas piadas sobre mulheres gordas até que a Srª mal humorada dá meia volta, regressa em minha direcção, levanta os braços e...dá-me um abraço, um abraço forte e longo. Quando ela me solta e olho em volta, todas as pessoas se abraçavam, homens, mulheres, bêbados ou não, gordos, magros, velhos e crianças, todos manifestavam a sua alegria por alguma coisa, havia algo que os unia a todos, mas desta vez não era o futebol nem um golo da selecção, desta vez festejava-se a vida de 155 pessoas que esperavam calmamente em cima da asa de um avião depois deste se ter despenhado num rio segundos antes.

Naquela noite assisti a uma das mais bonitas manifestações de amizade entre seres humanos, naquela noite não haviam clubes, religiões, nacionalidades nem classes sociais, éramos todos simples mortais felizes por se terem salvo tantas vidas.

Mas durou pouco tempo, depressa os dois homens voltaram à discussão e a mulher gorda se lembrou do café frio...

Enfim, já ninguém se lembrava do avião, nem do rio, nem dos 155 sortudos.

12.1.09

O rapaz que sonhou Versus morangos com chantilly


Mais um triste episódio da eterna luta entre, o rapaz que sonhou e uma taça de morangos com chantilly...

Outro belo dia se passou, o fim-de-semana avizinha-se e o ano ainda não trouxe nada de novo à rotineira vidinha de José.

Talvez movido pela frustração, o rapaz que sonhou dirige-se ao frigorífico e eis que se depara com uma cintilante taça de morangos com chantilly..."não posso!" diz em voz alta, mas a taça parece ganhar vida própria e José dá por si com a boca lambuzada de chantilly, e a taça outrora cheia de morangos aparece agora completamente vazia nas suas mãos, José jura não se lembrar de nada, e pensa até ter sido envolvido nalguma experiência extraterrestre...

Mais frustrado do que antes de abrir a porta do frigorífico José deita-se tranquilamente, mas durante a noite a consciência pesa-lhe e ele admite não terem sido extraterrestres a meter-lhe os morangos no estômago e como tal, sabe que irá sofrer de novo as consequências de mais uma vitória desse pequeno e indefeso frutinho vermelho.

"Oh my god!" diz ele. Com a região facial coberta de borbulhas resultado da alergia aos morangos, só lhe resta isolar-se do Mundo e passar um emocionante fim-de-semana enfiado em casa a ver as sempre fantásticas cassetes do Tom Sawyer.

10.1.09

ora bolas!

Depois de várias semanas de espera, num belo dia abro a caixa de correio e lá está a tão desejada carta. Finalmente chega o meu "myZONcard" , 52 sessões de cinema completamente à borla!
Fanático por cinema como sou, já me imaginava a assistir a um filme novinho em folha todas as semanas sem pagar nadinha, e até já tinha decidido ver o "Austrália" neste fim-de-semana. Mas...no mesmíssimo dia que recebo o meu precioso cartão, sou surpreendido através das noticías, que a Zon Multimédia foi obrigada pela Autoridade da Concorrência a suspender esta promoção, ORA BOLAS! no domingo lá vou eu ter que pagar cinco euros e meio para ver a Nicole Kidman...

7.1.09

Amigos, desculpem lá a coisa!


Os meus amigos dizem que estou diferente...

Depois de uma animada noite de passagem de ano repartida entre Cascais e Lisboa na companhia dos meus amigos, eis que chegam as queixas...
Entre outros o, H.A. a F.B. e a D.R. acham que estou diferente, e acham isso porque deixei de sair com eles todos os fins de semana à noite, porque tenho noites em que me apetece deitar cedo para poder aproveitar o dia seguinte, também acham que estou diferente porque comecei a ir mais vezes ao teatro e ao cinema, e dizem que comecei a ter atitudes estranhas como, por vezes ficar em casa a ler ou a escrever e acham que estou esquisito porque comecei a dedicar mais tempo, à minha familia...do que a eles, lol!!!

A opinião não foi geral. Aos que se queixaram peço desculpa mas...será da idade?



2.1.09

modernices de ano novo

O meu pai diz-se contra as novas tecnologias, mas reparem. No primeiro dia do ano depois de almoço fui à net, e enquanto consultava o meu e-mail liguei o skype a fim de matar saudades do meu irmão que está no Kosovo, chamei o meu pai ao quarto para ele falar um pouco com o meu mano, pensando que não demoraria mais de 5 minutinhos, só que o entusiasmo do meu pai era tanto que foi falando e falando sem dar pelo tempo passar, até que eu acabei por adormecer sem consultar o mail nem falar com o Manel. Quando acordei disse-me que esteve quase 2 horas na conversa.
Agora sempre que me vê entrar no quarto pergunta-me logo se vou "ligar aquela coisa" e eu tenho que mentir, senão qualquer dia não me dá tempo para utilizar o computador eh eh...
Beijinho Pai.

28.12.08

Rita Redshoes(Casino Lisboa)

Hoje é segunda feira. Para mim segunda feira é o mesmo que dizer folga.

E para este dia eu tinha vários planos, entre eles uma caminhada à beira Tejo com a minha amiga Susana, para esticar as perninhas e para pôr a conversa em dia...Adoro conversar com ela, a Susana é muito inteligente e uma das poucas pessoas que ultimamente me tem ouvido com atenção. Depois da longa caminhada ainda me convidou a ir até ao Chiado, para assistir à festinha de Natal dos alunos dela, eu adorava ir ouvir o coro infantil mas não pude aceitar, a noite estava a cair e eu já tinha outros planos, ainda tinha que passar pelo Centro Comercial, e tinha combinado com o João estar em casa dele às 20h00, para irmos ao concerto da Rita Redshoes.
À hora marcada lá estava eu, e juntos seguimos rumo ao Casino Lisboa, e apesar de termos parado para comer um gelado, ainda assim chegámos cedo porque eu não queria perder pitada do espectáculo da Rita. Nesta noite, eu sabia que algures no Casino estaria a Cláudia, não esperava era encontrá-la mesmo ao meu lado, foi uma surpresa agradável, lá estava ela com um sorriso na cara, e muito animada.
A rapariga dos sapatos vermelhos entrou em palco...e eu viajo para o meu mundo de sonhos.

Ultimamente a minha vida tem girado em torno da palavra sonho, ao escutar a Rita deixo-me envolver nas minhas recordações...e as recordações são quase tudo o que resta do meu sonho...esse sonho que eu não vou desistir!