11.11.09

O casaco azul

Passei parte da minha infãncia a observar um casaco azul pendurado num cabide no quarto dos meus pais. Tentava perceber porque seria tão especial aquele casaco.
Era um casaco azul com botões prateados e com um corte clássico dos anos 60 ou 70.
Mesmo depois da minha mãe morrer continuei sem saber a importãncia daquele casaco sempre tão escovadinho, tão perfeitinho.

Numa manhã, ao passar pelo quarto do meu pai vejo-o a chorar sentado na cama de casal que em tempos partilhou com a minha mãe. Sentei-me ao seu lado, peguei-lhe nas suas mãos grandes e àsperas e perguntei-lhe porque chorava.
-Vesti este casaco quando casei com a tua mãe -respondeu.
-Foi o dia mais feliz da minha vida, e desde que Ela partiu eu nunca mais consegui ser feliz.
Permaneci em silencio.
-Prometes-me uma coisa filho? -perguntou-me.
-Claro pai! -respondi, beijando-lhe a face picante da barba por fazer.
-Um dia quando eu partir para junto da tua mãe quero ir com este casaco vestido. Foi ao lado da tua mãe que o vesti pela única vez, e é quando a reencontrar que o quero ter vestido de novo.
Agora era eu quem chorava.
Percebera finalmente o valor do casaco azul.

Aquele casaco fez parte da minha infãncia. Muitas vezes vestio-o sem o meu pai saber, para fingir ser um homem grande no meu mundo pequenino. Cresci a olhar para ele, a observá-lo, a apreciá-lo, a tentar perceber a sua história...

Hoje custou-me entrar naquele quarto e ver o cabide despido... E saber que nunca mais verei aquele casaco azul.